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Vista número 1: a cortesã Takao

Atualizado: 29 de abr.

君はいま

駒形あたり

ほととぎす

 

kimi wa ima

Komagata atari

hototogisu

 

você agora

deve estar em Komagata

diz o cuco

 

Durante os séculos 17 e 18, onze tayu 太夫, garotas de programa de luxo do distrito dos prazeres de Yoshiwara 吉原遊廓, localizado na capital Edo 江戸, foram agraciadas com o myoseki 名跡, nome herdado, Takao 高尾. Cada uma se tornou famosa por razões distintas, e aqui Tsukioka Yoshitoshi retrata a sexta Takao, cujos versos eram bastante apreciados.

É cedo pela manhã, e o amante da jovem há pouco deixou o distrito para regressar à cidade. A moça então escuta o canto de um hototogisu 子規, espécie de cuco associado à alvorada e à solidão. O staccato — notas breves e destacadas umas das outras — produzido pela ave parece evocar Komagata 駒形, área próxima ao rio Sumida 隅田川 não muito distante da face sul de Yoshiwara, e Takao imagina seu amante no barco a atravessar a região. Daí a inspiração para o poema, que se tornou bastante conhecido.

A história da sexta Takao é bonita. Jirobei era funcionário de um estabelecimento dedicado ao tingimento de tecidos e, certa vez, foi na companhia de colegas a Yoshiwara admirar o desfile das tayu no bulevar central do distrito, em seu deslocamento dos bordéis às casas de chá. Calhou de Jirobei contemplar Takao, instante em que o homem ficou estarrecido com tamanha beleza e requinte. Ah, pudesse permanecer um minuto que fosse na sua companhia, sua vida valeria a pena!

Então, Jirobei trabalhou dia e noite, noite e dia durante um ano inteiro até economizar o suficiente para arcar com o agedai 揚げ代, cachê das prostitutas. Ingressou no bordel com o uniforme de trabalho, aparência suja, cabelos desgrenhados, barba malfeita e modos rústicos. Durante o breve encontro, porém, a sinceridade do seu amor conquistou o coração de Takao e ambos se casaram quando o contrato da garota com o bordel foi encerrado e as dívidas, quitadas. Apesar de inábil em seu ofício, Jirobei inaugurou a própria loja de tingimento de tecidos e esta prosperou graças àqueles que a frequentavam somente para admirar a beleza lendária da jovem.

O penteado de Takao e seu quimono com motivos de folhas e ideogramas são característicos do período Genroku 元禄 (1688-1704), considerado por gerações posteriores uma era de ouro, em que Yoshiwara e suas moças estavam profundamente arraigados no imaginário popular, visto à época inexistirem outros distritos dos prazeres na capital, assim como a instituição das gueixas 芸者.

Garotas de programa de luxo eram apreciadas pelo refinamento, erudição e beleza, e o ato de cortejá-las era um processo sofisticado que demandava protocolos, pré-encontros e muito dinheiro. Um passatempo bastante apreciado na companhia de uma tayu era a composição de versos encadeados, sugerido por Yoshitoshi na xilogravura.

 

其筆慕ふの夏の有明

北里某楼たれ

 

momokusa shitau natsu no ariake

[Kitazato boro Tare]

 

capins, às centenas, saudosos à aurora

[assinatura: Tare, do bordel Kitazato]

 

竹の窓袖なし衣つゝらせて

桂花園

 

take no mado sodenashi goromo tsuzurate

[Keikaen]

 

da janela de bambus, costuro um quimono sem mangas

[assinatura: Keikaen]

 

Os versos dialogam com o poema de Takao e auxiliam na construção da imagem da jovem melancólica pelo amante recém partido numa manhã de verão. Momokusa ainda é uma palavra de duplo sentido, em que momo pode significar coxas e kusa, pelos pubianos. Mais tarde, enquanto se dedicava à costura, a garota olharia através da janela de bambus e rememoraria o amado.

 

Título: Kimi wa ima Takao 君は今ーたか雄

Série: Tsuki hyakushi 月百姿 (1885-1892)

Artista: Tsukioka Yoshitoshi 月岡芳年 (1839-1892)

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