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A perda da motivação após o despertar

c33editora

Desde o despertar, nenhuma ânsia empreendedora me incomoda.

Esta é a história de como perdi toda a motivação e propósito após o despertar e da guinada que permitiu com que rompesse as amarras. Contudo, serei honesto: há boas e más notícias.

As más notícias é se tratar a perda de algo bastante comum, com a capacidade de fazer com que se sinta péssimo. As boas notícias é ser um estágio temporário. Existe uma saída. Compartilharei o grande erro por mim cometido ao tentar escapar desse período trevoso e o que me revigorou e permitiu com que retornasse à sociedade sem a necessidade de com esta romper de forma definitiva.

A história começa com o acender de um perigoso pavio. O despertar é similar ao disparar de um rojão com fogos de artifício. Acende-se o pavio do questionamento e a busca se inicia. Não se trata de uma escolha deliberada, é apenas tudo-o-que-há despertando a si mesmo. E, uma vez acendido, as consequências serão inevitáveis.

Digo ser perigoso por ameaçar o indivíduo, ou o assim chamado indivíduo. Porque, uma vez aceso o pavio, desencadeia-se uma série de eventos que conduz à compreensão de que você deixará de ser o que nunca foi e será quem de fato é. Uma vez aceso o pavio, o rojão dispara aos céus: é a chamada fase de ascensão. É empolgante, energética, novas perspectivas se desvelam em velocidade. Talvez proporcione epifanias e você enxergue as coisas de maneiras completamente novas — um transplante de olhos, por assim dizer. Ascende-se às alturas e o rojão explode: a fase de dissolução, quando o eu deixa de existir. Percebe-se que tudo é um, inexiste o indivíduo, é-se tudo ao mesmo tempo. Ou seja, de um ponto de vista pessoal, você é absolutamente nada. Embora maravilhoso, é também apavorante.

Mas, não se trata do fim.

Após a explosão, restarão cinzas, resquícios da vida anterior, resíduos daquilo então denominado eu antes do pavio do questionamento ser aceso. A existência pregressa, agora, está estilhaçada. Adquire-se a consciência de não ser um indivíduo à parte, de existir somente tudo-o-que-há. Percebe-se a unicidade, a não limitação ao corpo físico ou mesmo à mente. À medida em que as cinzas flutuam rumo ao chão, é-se tomado pela sensação de queda livre e por emoções perturbadoras, confusas e opressoras. Busca-se agarrar a algo palpável que o norteie, em vão. Nesse estágio, não há alternativas que reorientem a vida, e agitar-se à procura de algo sólido para segurar só criará mais pânico.

As coisas se assentarão enquanto se retorna à terra. Existirão traços de cinzas, porém a vida de outrora se desvaneceu junto com as motivações passadas. É como se a máquina que havia em seu peito, sentida quase fisicamente todas as manhãs ao acordar, a impulsionar você adiante — preciso disso, quero aquilo, evitarei isso, este sou eu, esta é minha identidade —, fosse removida por completo.

Então, como prosseguir? Onde buscar motivação? De onde virá a energia necessária? Aliás, qual o sentido? Trata-se de uma etapa desesperadora, espécie de limbo onde se vislumbrou a própria natureza, todavia ainda restam fragmentos do indivíduo de outrora.

Ao olhar em volta, após a disparada do rojão e sua explosão nas alturas, nota-se a vareta de madeira que o sustentava. É o corpo-mente. Estranho contemplá-lo, estranho permanecer ali após tudo o que foi vivenciado e sentido. Como seguir adiante, agora que sabe não ser quem supunha que era?

Não é mais como antes. Visto de fora, pode parecer que nada se alterou, mas sabe-se que a experiência não poderá ser desvista ou revertida. A máquina retirada não será recolocada ou consertada, ela se foi para sempre. Mas, as boas novas são: algo inédito pode, e irá, ocupar seu lugar. Houve uma movimentação energética, de sabedoria e verdade.

O movimento é sensível. Recebe-se informações via corpo-mente, a energia é absorvida enquanto o despertar acontece. É a razão pela qual, nas fases iniciais da iluminação, tais oscilações energéticas podem se manifestar na forma de preocupações constantes, alterações nos ciclos do sono, mudanças no sistema digestivo. Na fase de alta circulação de energia, é possível sentir-se hiperativo ou cansado ao extremo.

À medida em que o influxo acontece, o corpo-mente é completamente revirado. A convulsão pode ser amenizada diante das epifanias desdobradas, porém, após a explosão que proporciona alegria e liberdade, é necessário tempo para assimilar a avalanche de acontecimentos. Pode levar meses. É similar a um globo de neve sacudido de modo violento, que necessariamente acabará por assentar. E, uma vez assentado, uma nova energia e um novo ímpeto emergem em seu interior. Não se trata da velha máquina a refletir sua identidade antiga ou o sentimento caduco de individualidade, mas uma motivação inédita embebida na verdade que agora se é conhecedor.

Por meses, permaneci no limbo, carente de uma força motriz e ansioso por sair dessa condição. Apenas desejava fazer nada. E assim procedi, mas de modo forçado, literalmente inerte. Considerava ser o caminho certo, que permitiria às coisas virem à tona e serem assimiladas. Aguardava um sinal ou que a vida reemergisse. A verdade, contudo, era que ainda implementava uma forma sutil de resistência.

Pense na existência como um rio. Antes do despertar, esforçava-me em nadar contra a correnteza, em alcançar lugares predeterminados, lutar contra tudo e todos, enfrentar a vida e dobrá-la à minha vontade, conquistar, possuir, acumular bens materiais ao ponto da existência se tornar deles indissociável.

Após o despertar, tudo se desvaneceu — para nunca mais voltar. Todavia, nesse intervalo de dormência, em que acreditava me desapegar de tudo e aguardava o porvir, seguia obstinado. Não nadava contra a correnteza, é verdade, mas permanecia parado no rio, os braços cruzados, a repetir: não estou fazendo nada, não estou fazendo nada, não estou fazendo nada. Contudo, resistia ao fluxo das águas.

Era necessário rendição. Assim, não se force à imobilidade e à inatividade. Comprometa-se mais uma vez à vida, agora sem propósitos, objetivos ou motivações. Apenas porque ela assim demanda.

Gradualmente, passo a passo, a reintegração com a sociedade e o mundo conduzirão a uma nova energia impelidora. Caso sinta-se estacado, procure se abrir, permita-se o abandono e a fusão com a correnteza. Mantenha-se receptivo àquilo exigido no momento presente. É a única maneira de seguir adiante com a verdade recém descoberta.

 

postagem em parceria com @sunyateaching

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